quarta-feira, março 08, 2006
Despejou uma a uma as gavetas da cómoda e, ficou-se parada de cócoras, a olhar vagamente os montículos de papeis, tristes pudins liquefeitos.
Hesitou o gesto, e levantou-se.
Depois já meio recostado o corpo, o cotovelo rodou em abandono no braço da cadeira. Mecanicamente deslizou o polegar no isqueiro, o olho semicerrado brilhante da chama, o fumo inalado em estalo de nicotina nos alvéolos.
Um dia deixo de fumar, pensou.
Mas hoje não.
Hoje não.
Espalhou os papéis devagarinho, os dedos dos pés rodopiando leves, uma dança de cores e números, letras e desenhos de pequenos corações desbotados.
Rodou no bolso o batom do cieiro, atravessou a rua em linha recta, e parou no contentor, onde o saco do lixo aromatizado a pinho iria jazer meio esventrado. Tripas de papel, lado a lado com metades de ovos estrelados e batatas fritas, do pronto a comer da esquina.
Do lado direito de quem sobe. Ou do esquerdo de quem desce.
Os carros querem-se de frente. É que nunca se sabe, quem vem lá.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
O batom do cieiro anda sempre com ela. Hidrata e evita as "boqueiras" ;-)
ResponderEliminarbeijinho